As perfeições admiráveis dos Santos Anjos - Parte I

 

(Pelo Pe. Henri Marie Boudon, Livro "Devotion aux neuf choeurs des saints Anges et an particulier aux ss. anges gardiens" - ano de 1845)

        "As excelências dos anjos são como um oceano sem fundo e de extensão imensa. Já dissemos, é um abismo onde a mente se perde. As almas iluminadas sabem bem que o que dizem sobre o assunto está muito distante do que entendem sobre isso e o que entendem está distante da realidade. Pois é verdade que a grandeza dos anjos superam todos os pensamentos e palavras dos homens. A natureza angélica é um mundo inteiro de perfeições e, quando acrescentamos a isso o estado de graça e de glória, é sumamente admirável. É coisa muito certa que a natureza do homem, por mais perfeita que seja, está abaixo dos Anjos, pois assim nos ensina a palavra divina; mas um teólogo sério ensinou, o que na verdade não é de opinião comum, que o último dos Anjos no estado de glória está acima do maior dos Santos e neste sentido explicou as palavras da Escritura onde está dito que o último no reino do céus é maior do que João Batista, excetuando a incomparável Mãe de Deus, que sem dúvida está elevada acima de todos os Coros de Anjos e o glorioso São José, porque é de ordem diferente dos demais Santos pela extraordinária participação que teve na Redenção humana, tendo tido a qualidade de esposo da Mãe de Deus e pai putativo do Deus Homem e, de certa forma, a qualidade de salvador do Salvador. 

        Também é verdade que os Anjos são substâncias espirituais, incorruptíveis por natureza, perfeitamente livres da matéria e inteiramente isentos de todas estas misérias que nos cercam de todos os lados. Suas inteligências têm profunda clareza, conhecem toda natureza e aquilo que está mais oculto das maiores mentes que já existiram, é perfeitamente conhecido por eles; e eles compreendem as coisas sem dificuldade, ao mesmo tempo e num momento, sem qualquer dúvida ou obscuridade. Eles não falam como os homens e não entendem o que sabem como nós, raciocinando de uma coisa para outra: à primeira vista que têm eles compreendem, por isso são chamados inteligências por excelência. A Escritura lhes dá uma vestimenta brilhante e ardente para nos mostrar sua iluminação; dá-lhes no Apocalipse um hábito semelhante ao dos antigos pontífices, para nos fazer entender que os santíssimos mistérios da religião lhes são revelados; finalmente, representa-os cobertos de nuvens para nos ensinar que suas luzes são brilhantes demais para serem imaginadas por nossas mentes, só se o pode considerar de modo velado pois as opiniões dos homens não são suficientes para o considerar. Os homens mais instruídos do mundo são apenas crianças comparados com estas Inteligências puras. 

        Seu poder é também incrível. Um único Anjo poderia derrotar milhões de homens postos em batalha e todos os homens do mundo juntos. Ele poderia fazer mudanças maravilhosas nos elementos, nas cidades, nas províncias e nos reinos. Os Anjos podem fazer soprar ventos, cair chuva, ressoar trovões, provocar tempestades, terremotos, parar os rios, dar abundância ou fome, curar todos os tipos de doenças ou dar outras incuráveis, e uma série de outras maravilhas cujas causas são desconhecidas pelos homens, e tudo isso quase num momento. 

            Eles são pintados com asas para demonstrar sua velocidade que ultrapassa aquela dos ventos; num instante passam de um extremo ao outro do mundo, estando assim em toda parte, como fala Tertuliano. Mas suas belezas são bastante arrebatadoras: os mais belos da terra são apenas fealdades comparados com essas belezas celestiais. Os Anjos são apenas beleza e o mínimo de todos eles é mais belo do que todas as belezas do mundo reunidas. A mente aqui se perde no pensamento de uma infinidade de belezas que se reúnem entre esses coros Angélicos, pois todos os Anjos são diferentes em espécies e, portanto, de belezas diferentes, e o menor tem mais que todas as criaturas da terra; e por outro lado, seu número é como que infinito, não podendo ser contado pelos homens, mas somente por Deus. Ó meu Deus! Que belezas na Santa Sião! Mas até onde chegam os primeiros Espíritos desta Cidade gloriosa? Costumo reportar-me ordinariamente sobre este assunto a um sentimento de Santo Anselmo que, para nos dar uma ideia destas verdades com algo que toque a nossos sentidos, disse que se Deus colocasse um Anjo no lugar do sol e o cercasse com tantos sóis quantas estrelas existem e se permitisse que esse Espírito bem-aventurado fluísse em um corpo emprestado algum raio de suas luzes, eclipsaria todo o brilho destes sóis e os tornaria invisíveis a nossos olhos. Um sábio estimou que o próprio sol que ilumina este universo não tem outra luz senão aquela que recebe do Anjo que o move porque embora o Anjo não seja para este astro senão uma forma de assistência, ele pode comunicar-lhe toda sua claridade, como o sangue do corpo humano recebe da alma que o anima um certo brilho que perde logo que ela se separa  do corpo. 

        Enfim, tudo é encantador nestes espíritos amáveis. Um Anjo apareceu a São Francisco e, para recreá-lo, tocou um instrumento musical; tocou-o apenas uma vez, mas o fez tão melodiosamente que este santo assegurou que teria morrido por tão excessiva suavidade, se ele tocasse outra vez. Este pássaro milagroso, cujo canto outrora ocupou tão agradavelmente um Religioso servo de Deus em sua solidão, tendo este ali passado vários anos sem qualquer tédio, com tanta alegria que acreditou ter estado apenas um quarto de hora, foi sem dúvida um Anjo que tomou a aparência deste pássaro.  O Padre Corneille de la Pierre testemunha que, querendo examinar a verdade deste milagre, viajou propositalmente aos lugares onde se dizia tinha passado o Religioso e foi ao mosteiro onde ele se encontrava e, depois de examinar tudo cuidadosamente, encontrou evidências muito certas disso. Esta é também a razão pela qual os Anjos foram criados no Céu empíreo: era muito razoável que tais criaturas nobres e perfeitas tivessem a sua origem no Céu, a morada da felicidade e de todo bem."

CONTINUA....